Seu Juca Sem Fio *
Quem é de andar... anda,
anda com ou sem as pernas,
que o único entrave é o talho nas
córneas d’alma, mal querência do fio
do nefando horizonte comum.
Por isso, poucos andam, de fato,
embora muitos pensem que sim,
que andam, que caminham, que vão
rumo aos rumos não-circulares
vedados a eles, pobre diabos que
rodam apenas a passo mecânico,
ponteiros de relógio que são.
Ah, eles nem sabem onde pisam,
mas preferem o cimento ao barro
e o asfalto ao paralelepípedo.
Não sabem que qualquer chão é caminho
de seda, tramada pelos raios do sol;
de veludo, urdido pelo luar, pelos estelares;
ou de algodão, das nuvens quando pousam.
Quem anda mesmo encontra o chão
e, no chão, até o que é dos ares e das águas.
Como essa moça que outro dia eu vi menina,
a saltitar pelas areias do céu de Bangu
e a me gritar, bem lá da esquina
de Vega com Aldebarã: – Ei, seu moço,
aceita umas asas de fruto do mar?
Eu sorri, e lá veio ela atrás de mim,
a me chover, por mais de légua, légua e meia,
uma garoa luminosa infinita de conchinhas
que catava com os olhos alumbrados
e pelo coração cuspia neste mundo.
\ô/
- * Seu Juca Sem Fio é um andarilho da Zona Oeste do Rio de Janeiro. Este poema foi escrito especialmente para os 18 anos de Raissa Medeiros e publicado (não na íntegra, como agora aqui) no blog desinformação seletiva, em postagem que reuniu autores como António Cabrita, Ana Jácomo, Assis Freitas, Marcantonio, Jorge Pimenta, Betina Moraes, Cris de Souza, Rita Santana, Bípede Falante, Paulinho Saturnino, Ira Buscacio, Suzana Guimarães, Jenny Paulla, Pólen Radioativo, Patricia Gonçalves, Marcel Zanner ... e até Wilden Barreiro! Foi um prazer e uma honra participar desta belíssima homenagem, luxuosamente editada e ilustrada por Tuca Zamagna e seus três asseclas. Confiram, aqui.
Wilden, Wilden! Tamanha beleza é o que torna a postagem de Tuca e dos seus Pares uma magia, um deslumbramento. Despertou até a atriz que adormeceu dentro de mim e nunca mais saiu. Deu vontade de gravar o poema. Quando essa vontade chega, é porque a coisa é muito boa. Brindemos aos 18 anos de Raíssa.
ResponderExcluirEm segredo vou dizer aqui, o que não ficaria bem destacar por lá: este poema me impressionou, achei belíssimo! Comovente homenagem que ainda trás uma didática do 'andar'.
ResponderExcluirGrande abraço.
Tou ainda meio atarantada para dizer o que sinto porque vi essa menina com asas de fruto do mar a chover sobre ele, a chover pelo micro e agora vejo que começa a chover em mim.
ResponderExcluirEu ando enjoada de adjetivos, mas esse poemas é mesmo lindo :)
beijos.
olhe, sêo caisa de cangalhar...
ResponderExcluirtou meio que concordando com a vizinha bípede...
me pegou de perninhas bambas1
beijos, até que minha volta...
Lindo mesmo, Wilden.
ResponderExcluirGrande beijo!
Impressionante este poema. Concordo com o Marcantonio: é o melhor da postagem pelos 18 anos da Raíssa.
ResponderExcluirAbraço
Amei. Não sabia que Seu Juca escrevia poesia, mas já me impressionara muito com as duas entrevistas dele ao Desinformação Seletiva.
ResponderExcluirBeijo
Belíssimo poema! Para se guardar feito joia rara.
ResponderExcluirA primeira estrofe e a última, então, sem palavras para comentar, apenas aplaudir.
Quanto ao teu texto, Wilden. Repito o que escrevi no Facebook, eu adorei! Eu quis entrar naquele guarda-roupa junto com toda a família e o cachorro também! Me vi na cena, parece peça de teatro. O máximo em criatividade! Parabéns!
Um abraço,
Suzana/LILY
P.S.: Os meus lindos sapatos são presente do Teopha.
Meus pés ficaram anestesiados ao andar por esses caminhos.
ResponderExcluirEu não conheço a menina Raíssa, mas gostei tanto do seu Juca...
ResponderExcluirGosto de gente que entende de chuva de outras gentes, por mais de légua...
bjs
Rossana
...É fascinante, é clareador.
ResponderExcluirO substantivo que minha frase precisa...
Muito bom teu espaço, estou te seguindo, espero que me sigas tbm!
Um abraço,
Fascinante poema, Wilden. A fala e a imagem que geraram o título são simplesmente geniais. Bjs
ResponderExcluir