. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Comigo me desavim
. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Sá de Miranda
. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Comigo me desavim,
. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Sou posto em todo perigo;
. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Não posso viver comigo
. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Nem posso fugir de mim.
. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Com dor, da gente fugia,
. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Antes que esta assim crescesse:
. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Agora já fugiria
. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . De mim, se de mim pudesse.
. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Que meio espero ou que fim
. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Do vão trabalho que sigo,
. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Pois que trago a mim comigo
. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Tamanho imigo* de mim?
. . . \ò/ . \ó/
Francisco de Sá de Miranda – mormente por este poema e pelo soneto “O sol é grande” – é bem conhecido de todos que apreciam a literatura em língua portuguesa. Mas postá-lo aqui no blog era obrigatório, pois o poeta abriu-me horizontes novos e amplos desde que o li pela primeira vez, no final da adolescência. Não dei-lhe muita bola no primeiro momento, por julgar tratar-se apenas de mais um poetinha que gostava de Fernando Pessoa, como eu (ou eus). Só depois fiquei sabendo que o Sá vivera quatro séculos antes do Pessoa. E tal informação me estarreceu: um gajo falando do eu (ou eus) na época em que tema poético eram as grandes peripécias náuticas lusitanas, os bastidores da corte, os costumes bizarros do povaréu e, claro, o tal do amor? Depois, também, fiquei sabendo que este de Sá, reles poeta e professor, era irmão do de Sá VENCEDOR, o Mem, terceiro Governador-Geral do Brasil, cujo grande feito foi ter botado os franceses para correr (no colo dos Tamoio) e transferido para o Morro do Castelo a cidade maravilhosa fundada por seu sobrinho Estácio. Mem de Sá, aliás, assumiu o Governo-Geral do Brasil em janeiro 1558, três ou quatro meses antes (há controvérsias sobre a data) da morte do poeta. A Sá de Miranda, a poesia portuguesa deve a introdução de várias formas poéticas trazidas por ele da Itália, dentre elas o verso decassílabo, metro com que Camõe se consagraria n’Os Lusíadas. Deve a arte portuguesa à Sá, ainda, a primeira crítica sistemática – e pública – ao dramaturgo e poeta Gil Vicente, e essa dívida é filha de uma outra, contraída e paga, com juros pesados, pelo próprio poeta, ao comprar um inimigo (ou *imigo, forma também usada na época) poderosíssimo. Os desgostos decorrentes dessa inimizade é que teriam levado Sá de Miranda a “exilar-se” no campo, deixando sua Pasárgada – Coimbra –, onde era amigo do rei (D. João III).
Wilden,
ResponderExcluirPassar aqui e ler algo tão bonito, me faz um bem danado.
Humildemente digo que não conhecia o mesmo, mas valeu a dica.
Um beijo meu querido!
o assombro da sombra
ResponderExcluirque ora é densa
que ora é tenra
vem de longe
e sem trégua
...
forte abraço,
camarada.
Adorei seu texto e o poema.
ResponderExcluirSempre bom aprender e conhecer coisas novas.
Lá vou em em busca de Sá de Miranda.
:)
bjs
Rossana
Permita-me uma palavrinha, antigo palavrão: porra! Uma beleza isso! Pelos perdedores tenho uma já mais do que inevitável simpatia corporativa.
ResponderExcluirAinda bem que ao mencionar a si próprio você se permitiu a alternativa do plural.
Grande abraço.
Lindo. Lindo mesmo.
ResponderExcluirAbraços!
Wilden, costuma-se lembrar sempre de Sá de Miranda como esse arauto do Classicismo em Portugal, mas a leitura dos seus poemas é quase impraticável. Você joga o homem aos nossos olhares. Delicado o seu gesto. beijos!
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