Este fígado em frangalhos é meu.
Nem mesmo de vista o conheço,
mas reconheço a dor e as vezes
do bico cravado dos abutres.
Minhas, estas asas de coração.
Nunca as vi, nunca o vi voar,
porque cegou-me sempre
toda paixão que me viveu.
Este mingau derramado, meu cérebro,
poça de pensamentos impensáveis,
máxima fortuna amealhada
que ninguém quis ouvir e cobiçar.
Meus, estes grandes lábios vulvares,
sombra e bainha do feminino aríete
que Deus não quis e o Diabo me deu
para ser fêmea cada vez que fui macho.
E ainda estas minhas mãos cheias
do vasto vazio escrito por meus pés
enquanto eu garimpava mundos e fundos
no caos dos corpos do meu corpo.